Nesse meu já longo andar, tenho nítidas, três vezes em que vi a felicidade.
Um casal de namorados, vivendo em cidades diferentes. Naqueles tempos, os meios de locomoção, existiam, mas, eram lentos e deficientes.
Assim, os encontros não eram fáceis, pois, necessitava-se viajar, para os namorados se verem de perto.
E em termos de afetividade, demonstrações de carinho e afeto, também, os tempos eram outros.
O respeito, imprescindível.
Qualquer deslize ou o rapaz tinha de dar no pé ou, a moça, ficava "mal falada". O ato de namorar era escondido, restrito, nem a quatro paredes, mas, a interiores de salas, sempre com uma pessoa mais velha a vigiar, mesmo fingindo companhia ou, ali estando, por não ter outro local pra fazer crochê ou tricô, às vezes folheando um jornal e ou uma revista, daquelas antigas, porque, se a locomoção era difícil a chegada do correio, mais demorada...
Numa dessas tardes de primavera em que o vento nos deixa mais assanhados, os vi, dois jovens, moradores em cidades vizinhas, no corredor da casa dela, de mãos dadas, correndo em direção ao portão da rua, descabelados, absortos, rindo, sorrindo, de uma maneira espontânea, descontraída, alheios a tudo e a todos, fora do nosso mundo, num mundo só deles: foi a primeira face da felicidade que me marcou.
Em determinado local, se a ele se for, num domingo, encontrar-se-á um casal de meia idade.
Os dois muito bem vestidos, bem apessoados. A senhora com pequenas marcas que o tempo lhe deixou, ele, mais marcado pela vida - vela e zela pelo marido, com carinho, com atenção, com desprendimento, levando-o e aproximando-se também do Ser supremo.
É de admirar-se, se embasbacar em ver, notar e sentir, com que contrição ela o conduz à mesa da comunhão. Arruma-o, dá-lhe atenção, demonstra um amor que a gente, com o passar dos anos, acreditara não mais existir.
Ele, com as sequelas que a vida lhe reservou, parece alheio a tudo. Sabe ela que é assim. Com devoção de mãe e esposa, sabe mais, que esse afeto, essas demonstrações de amor ele precisa, mesmo que já não os entenda. Que bela imagem, que belo quadro, dignos de estarem num local destacado da igreja que frequentam, para servir de exemplo, referência e reverência aos paroquianos, como os santos o são, em altares, para a humanidade.
E a terceira face...
Uma mãe acabara de ser abençoada por Deus que lhe deu o primeiro filho. Como parentes, afetos, padrinhos, ela, a mãe, exigiu nossa presença no hospital para o dia seguinte, mesmo morando nós, em capitais diferentes.
O amor nos impeliu a servirmo-nos do primeiro avião disponível, para estarmos perto dela, junto a ela, nos momentos divinos do nascer de uma criança. Os padrinhos sem pensar, duas vezes, se foram ao encontro da felicidade. Em lá chegando, se deparam com a mãe tendo a criança em seu regaço, em seu leito, juntos, colados, como se ainda o bebê não tivesse nascido. Como se ele ainda, se mantivesse no interior do corpo, no ventre materno.
E a cena que vimos, com lágrimas correndo dos olhos, não foi de uma mãe, simplesmente com o filho junto a si. A imagem que trago é como se a mãe, querendo, tornar-se pequenina como seu rebento, metamorfoseara-se, virara bebê. A gente olhando, corpos juntinhos, não se sabia, com certeza, qual era a mãe e qual era o filho.