Fatos e Fotos

Baú de Relíquias - A bola não pára

Alberto Samaniego (Paraguaio)

Carlos Alberto Kolecza (*)

Apareceu em Santa Rosa em fins da década de 40, foragido.

Havia se envolvido numa encrenca política, cabeluda. Um golpe de estado sob as ordens de ALFREDO STROESSNER, amigo de infância na cidade de Encarnacion e seu Tenente na Guerra do Chaco (contra a Bolívia).

O golpe falhou.

Virou ídolo do Paladino, junto com Nolly Joner que o visitava, quando vinha a Santa Rosa. Casado com minha prima Iracema.

Nunca o vi jogar. Certa vez, entrou de brincadeira num treino nosso, no campo do antigo estádio e descadeirou seu marcadores, com dribles desconcertantes. Aí entendi sua fama. Virou pintor de casas, sempre ligado nas notícias do Paraguai.

Era um dos poucos donos de rádio, nas redondezas. Usando as ondas curtas na tarde sintonizava uma emissora de Encarnacion.

Quando Stroessner tomou o poder em 1955, mandou chamá-lo e deu-lhe o posto de Primeiro Sargento.

Com a família (meu pai emprestou dinheiro para a viagem), se foi para lá, mas deu-se mal.A disciplina era rigorosa demais para quem já gostava de uns tragos a mais.Voltou para os pinceis e broxas, em Santa Rosa.Nos fins da tarde a casa se enchia de amigos para uma roda de tererê (mate frio) com adoçante, seguido de uma rodada de samba (cachaça com guaraná).Nas pescarias, no Pessegueiro, contava detalhes da sede que sofreram cercados pelos bolivianos, de filtrarem a própria urina até serem capturados.Dele ficaram histórias folclóricas.Em dias de eleição (a venda das bebidas era proibida passou escondido num Bolicho próximo ao quartel.Ao voltar para casa, ziguezagueando, foi parado pelo xerife delegado Wvilde Pacheco, que passara o dia na caça em vão aos bebuns e voltava frustrado à Delegacia.Com o seu vozeirão o delegado intimou: Onde é que tu bebeu? Resposta dele: “Te vira como eu me virei”. Surpreso Wvilde voltou para o jipe dando risada. Sempre inventava algo imprevisível. Quando o rádio era a bateria saiu, de madrugada, pela rua para dar uma serenata. Carregava o aparelho no ombro; suava com o peso da bateria.De outra feita, no verão, comprou um caíque para navegarmos acima da “taipa” (a represa que desviava água para o matadouro do Ruzzarin). No terceiro dia o caíque sumiu. Não se chateou. Sua filosofia era aproveitar a vida no momento. Depois, era depois.Ficou famosa a expedição – SABIÁ, FLAVIO PITTAS e outros que fizeram pelo rio Comandaí, apreendendo redes e “paris” (as gaiolas que capturavam os peixes graúdos em pontos estratégicos do rio). Foi uma farra ecológica que durou dias.Foi técnico na fase inicial do Sepé, por pouco tempo. Com ele aprendi que o estádio Defensores del Chaco, em Assunção, deve o nome ao descampado onde os rapazes recrutados para a guerra – ele tinha 16 anos – recebiam os rudimentos de como montar e desarmar uma arma e como se comportar em combate.Quando pôde ia a cada três meses ao Paraguai sacar o minguado soldo de ex-combatente.De nossas conversas de pescaria guardo um grande arrependimento. Foi quando se ofereceu para me ensinar o guarani – a verdadeira língua dos paraguaios – e eu, burro e mal - educadamente, respondi que seria perda de tempo.Os últimos 20 anos de sua vida foram de sobriedade, desde o ultimato do Dr. Paulo Stefen, do Hospital de Caridade de Santa Rosa.Morreu, em São Gabriel, em 1993, pelos meus cálculos as 77 anos.

(*) Jornalista, fez os estudos primários na cidade de Santa Rosa. Vindo para Porto Alegre descobriu os encantos da capital. Estudando no Julinho começou a revelar suas qualidades de talento e de militância político-estudantil.Já em 1967, como integrante dos quadros da RBS, cobriu a Conferência de Punta del Este, no Uruguai. Foi designado na volta para testemunhar a Guerra do Vietnã, que fez. Daí seguiu para Israel, onde registrou a Guerra dos Seis Dias. Em 1973 recebeu o Prêmio Esso de Jornalismo com a reportagem sobre o Tratado de Itaipu, pela Folha da Manhã de Porto Alegre.


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